Interesse do brasileiro por joias aumenta, e setor acelera crescimento para além das marcas de alto luxo

A elite brasileira está comprando mais joias no país em vez de viajar para gastar nas melhores casas do ramo em dólares e euros. Tanto que o país virou destino de grandes marcas globais de luxo.

Grifes como Tiffany e Cartier, que atuam na alta joalheria, reforçam por aqui as apostas em abertura e renovação de lojas, eventos e relacionamento próximo à clientela. Tudo costurado com personalização e exclusividade, como é mandatório no mercado de luxo, como mostrou ontem reportagem do GLOBO.

Mas esse movimento acaba ajudando a puxar o segmento que está um degrau abaixo, o de consumidores com alto poder aquisitivo, mas não só os que têm a disposição de pagar por joias que podem custar mais de R$ 1 milhão. A joalheria para as classes alta e média também está em franca expansão no Brasil.

O mercado de joias cresce como um todo no país, ampliando a base e também atraindo grandes marcas internacionais. São Paulo, motor econômico do país, concentra essa escalada rumo ao topo da joalheria internacional.

Estudo da Bain & Company mostra que o mercado de luxo no Brasil deve movimentar R$ 133 bilhões no país em 2030, um salto sobre os R$ 74 bilhões registrados em 2022, após expansão de 18% ao ano desde 2018. Dentro desse mercado, o segmento de moda e itens pessoais, que inclui joias, pode passar de R$ 18 bilhões para até R$ 20 bilhões, com uma expansão estimada em 8% a 10% ao ano.

Nas redes voltadas para as classes média e alta, é nítido o foco em reforçar o sortimento mais premium e sofisticado de peças, com o objetivo de alcançar públicos de maior renda.

— O Brasil tem um mercado de potencial enorme. E tudo que mira no mercado de luxo é movido a desejo. Uma marca que quer atingir a base tem que atingir o topo. Então, as marcas vão reforçando sua oferta premium e subindo degraus — explica Gustavo Franco, professor do Hub de Moda e Luxo da ESPM.

A austríaca Swarovsky e a dinamarquesa Pandora lançaram suas linhas de joias com diamantes cultivados em laboratório, preservando a qualidade na comparação com os diamantes minerados na natureza. E avançam com apetite no mercado brasileiro.

A Pandora bateu quase 200 lojas no país em 2023, após inaugurar 50 unidades nos três últimos meses do ano. Planeja abrir outras 34 em 2024, avançando não apenas nas vendas de seu carro-chefe, braceletes e charms (pendentes), mas ampliando o número de produtos e linhas mais sofisticadas. É com esse olhar que a marca acaba de trazer ao Brasil sua linha de diamantes cultivados, presente agora em apenas cinco dos cem países onde a Pandora atua.

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Martin Pereyra Rozas, gerente-geral da América Latina e Ásia Pacífico da Pandora, explicou, em entrevista ao GLOBO, que o Brasil tem potencial para superar o México, atualmente o principal mercado latino-americano da marca.

A Swarovski, em paralelo, soma 121 pontos de venda no Brasil, sendo 69 próprios. Mas entende haver potencial para inaugurar outras 50, avalia o CEO Alexis Nasard. O país é descrito pelo executivo, em conversa anterior com O GLOBO, como um dos mercados de melhor desempenho em vendas das peças de alta complexidade da marca.

Vivara voa, mas com turbulências

A Vivara, rede brasileira de joalheria, também avança com fôlego. Alcançou 390 lojas em operação no país em 2023, com 54 aberturas. No ano, teve um lucro líquido de R$ 369,2 milhões, alta de 2,3% na comparação com o ano anterior. Enquanto a receita alcançou R$ 2,8 bilhões, avanço de 21,2% na comparação com um ano antes, segundo resultados divulgados na semana passada pela companhia.

Essa expansão foi puxada por avanços como o recorde em vendas para um trimestre registrado entre outubro e dezembro, somando R$ 1 bilhão em receita bruta, ou 26% mais que nesses mesmos três meses de 2022. As altas de vendas no Black Friday e no Natal foram de 31,2% e 20,3%, respectivamente, segundo a companhia.

A Life, a marca do grupo voltada para o público mais jovem, mais que dobrou a receita, para R$ 431,8 milhões. A maior fatia do resultado, porém, vem da marca Vivara, que somou R$ 1,9% em receita bruta, com crescimento de 7,9% na comparação com 2022.

Marina Cirelli, diretora de Marketing, Sustentabilidade e Comunicação da Vivara, afirma que existe neste momento um cliente mais exigente e à procura de produtos de alta joalheria, com designs mais exclusivos:

— Estamos não apenas acompanhando de perto essa demanda, mas preparados para atender este cliente. Um dos principais diferenciais da Vivara é a nossa capacidade de transitar entre vários tipos de perfis, indo de peças mais democráticas ao alto luxo, com opções que levam diamantes e outras gemas preciosas, por exemplo, que alguns produtos podem superar três dígitos.

Os resultados e perspectivas da Vivara tornaram a rede de joalherias brasileira um foco de interesses de investidores na Bolsa interessados na tese de crescimento desse segmento do mercado de luxo. Mas uma mudança no comando recente da empresa gerou mal estar no mercado financeiro.

No último dia 15, a Vivara anunciou a volta de seu fundador, Nelson Kaufman ao comando da companhia, enquanto seu sobrinho Paulo Kruglensky deixou o posto de CEO, após ter conduzido um processo de crescimento forte e acelerado do grupo nos últimos anos. Essa mudança levantou incertezas junto aos investidores, derrubando as ações da Vivara na Bolsa.

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O principal risco recai sobre a meta de Kaufman de internacionalizar a companhia, o que seria um desafio, segundo investidores, como informou a coluna Capital, por se tratar de um mercado dominado por grandes grupos globais.

Otávio Lyra, diretor financeiro da Vivara, durante a teleconferência para divulgação dos resultados de 2023 realizada na semana passada, reforçou que a troca no comando não irá impactar a forma como o negócio vem sendo conduzido. E manteve a estimativa de inauguração de 70 a 80 lojas este ano.

Atenção à conformidade

Com as pressões relacionadas a ações ESG (que envolve práticas nas áreas ambiental, social e de governança pelas companhias), avançam ainda as medidas com foco em sustentabilidade e transparência. O setor é cada vez mais pressionado adotar medidas para não se associar a esquemas criminosos, como garimpos ilegais e fraudes financeiras.

No Brasil, um revés em particular marcou o setor, após joalherias terem sido apontadas pela Operação Lava-Jato como veículos de lavagem de dinheiro de corrupção para políticos. Mecanismos de legalização de ouro e pedras preciosas de garimpos ilegais também preocupam.

— No geral, tem havido um esforço grande de governança nas empresas do setor — destaca Franco, da ESPM.

Na frente de sustentabilidade também há iniciativas em curso. A Pandora, por exemplo, adotou uma certificação de qualidade para seus diamantes e também de origem e rastreabilidade de seus insumos, utilizando 100% de prata e ouro recicláveis para produzir suas joias.

Brasil na rota das joias de alto luxo

Em São Paulo, o shopping Cidade Jardim tem recebido marcas globais da alta joalheria em busca desse maior interesse dos brasileiros endinheirados por joias. Seu serviço CJ Fashion Private Shopper, de atendimento exclusivo a clientes para necessidades de compra, de dois anos para cá, tem a joalheria como a segunda categoria de maior demanda, atrás apenas de moda.

No ano passado, conta Harley, a francesa Cartier, de joias e acessórios, abriu no endereço paulistano uma loja-conceito. A italiana Bulgari — do mesmo grupo da Tiffany & Co — fez o mesmo, também chegando ao Cidade Jardim com sua maior unidade na América Latina e trazendo coleções exclusivas de alta joalheria.

Esse segmento é também a âncora de um evento que outra francesa, a Hermès, famosa pelos lenços de seda e acessórios em couro, realiza mês que vem no shopping. Em meados do ano, a joalheria Van Cleef & Arpels, já presente no Iguatemi, chega ao Cidade Jardim, lista Harley.

Há dois facilitadores específicos ao consumo dessas joias no Brasil. Um é o pagamento parcelado. Outro é que os preços se tornaram competitivos com os do exterior. Especialistas no setor avaliam que as marcas internacionais acabam, de alguma forma, “subsidiando” impostos de importação.

— Mesmo marcas que não atuavam em alta joalheria estão entendendo esse movimento e ingressando no segmento, como é o caso da (italiana) Fendi, por exemplo. Localmente, vemos investimento em novas lojas e também em e-commerce, para ampliar a distribuição — explica Gustavo Franco, professor do Hub de Moda e Luxo da ESPM.

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